Ademi Gomes

Só Deus é perfeito

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CARTA DE DESPEDIDA#
CARTA DE DESPEDIDA
Em 23 de dezembro de 1956, em Flores, Sertão do Ceará, eu nasci, sendo o sétimo filho de Manoel Carolindo Gomes e Francisca Lourenço. Acho que já nasci com vontade de vencer. Conforme fui crescendo, entendi que naquele lugar não havia futuro para mim.
Com nove anos, comecei a colocar meu plano em prática. Aos quatorze, conheci um senhor que morava em Fortaleza e ele me convidou para trabalhar em sua casa. Não pensei duas vezes, pois era a chance que eu precisava.
Aos dezenove, surgiu a oportunidade de ir para São Paulo. Peguei carona no carro de um amigo da minha patroa, que estava de férias em Fortaleza. Acabei indo parar no Rio de Janeiro. Como esse rapaz era aluno do Colégio Militar, eu não podia ficar com ele. Então, ele pediu a uma família conhecida que eu passasse aquela noite com eles e, no dia seguinte, me levaria à rodoviária.
No dia seguinte, ele foi me encontrar, mas a família não permitiu que eu fosse para São Paulo, sugerindo que eu ficasse na cidade para conhecer o carnaval carioca. O carnaval acabou, mas eu nunca fui para São Paulo. Costumo dizer que me adotaram e eu os adotei como minha família no Rio.
Ainda criança, eu dizia para a minha mãe: “Mãe, um dia vou embora, vou morar na cidade grande, vou estudar, trabalhar, ganhar dinheiro e comprar uma casa para a senhora na cidade, te tirar deste lugar”. Os anos foram passando e, mesmo morando em Fortaleza, eu não tinha nenhuma expectativa de vida.
Como disse anteriormente, só aos dezenove anos, quando cheguei no Rio de Janeiro, comecei uma nova vida, com a ajuda de pessoas que jamais pensei em conhecer. Trabalhando e estudando, consegui, junto com o meu companheiro, levantar uma grana. Foi aí que comprei a casinha da minha mãe numa cidadezinha do interior.
A minha maior felicidade foi ver a felicidade dela e do meu pai. Antes mesmo de eu comprar a casa, eu já pagava um aluguel de cinquenta reais nessa mesma cidadezinha. Meu pai era contra, pois achava caro, e a vontade dele era voltar para a roça, onde ele mesmo construiu sua própria casa de taipa.
Desde criança, eu tinha vontade de ser artista, igual aos violeiros que havia no interior, pois eram os únicos famosos que eu conhecia, já que não sabia o que era ser estrela de TV, pois sequer assistia televisão. Aos quatorze anos, quando fui morar em Fortaleza, eu não frequentei escola, não tendo muita chance de estudar. Nos cinco anos que morei por lá, só frequentei o MOBRAL.
Já aqui no Rio, como eu tinha que trabalhar e não tinha comprovação de escolaridade, tive que fazer uma prova referente ao MOBRAL na própria Secretaria de Educação, começando assim a trabalhar e estudar.
Meu primeiro emprego foi de repositor em um supermercado, onde fiquei por três meses. Passei a fazer alguns bicos até que consegui outro emprego, dessa vez de office boy em uma corretora de seguros, onde trabalhei por dezesseis anos.
Como já estava estabilizado aqui, resolvi colocar em prática o meu desejo de ser artista. Passei a pesquisar anúncios de agências de figuração e me cadastrei em uma. Foi assim que cheguei até as novelas da TV Globo.
Fui contratado pela agência como fiscal, e como tal, tive acesso às produções, criando amizades com os profissionais da produção e da direção. Sempre fui uma pessoa prestativa, por isso, nas horas em que eu não estava no set de gravação, estava na produção, ajudando no que fosse preciso.
Em 1994, consegui o meu primeiro contrato como elenco de apoio na novela Irmãos Coragem, porém não atuei, fazia apenas produção base. Depois, fui contratado para trabalhar em mais três novelas, sempre fazendo a produção base.
Aos poucos, fui mostrando meu interesse em trabalhar em produção. Além disso, exerci algumas funções de elenco de apoio. Também estive em outras funções, como contínuo, contrarregrador, camareiro, auxiliar de produção e produtor assistente, minha última função na TV Globo.
Mas como nem tudo são flores, chorei, ri, fui rude, me diverti, fui moleque, fui sério, trabalhei muito, fui responsável, fui colega, fiz grandes amigos, compartilhei grandes produções e fui feliz.
Hoje, não faço mais parte do quadro de funcionários das Organizações Globo, mas estou com o meu coração tranquilo, pois tudo o que fiz por lá, fiz com prazer.
Fiz grandes amigos, desde o mais humilde trabalhador até os grandes executivos da empresa e os grandes talentos da dramaturgia. Os problemas que tive não se comparam com a grande família que fiz, grandes irmãos do coração. Aprendi a amá-los e respeitá-los.
Só gratidão.
Ademi
Ademi Gomes
Enviado por Ademi Gomes em 05/03/2025


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